Pesquisa traz dados da realidade socioeconômica da classe trabalhadora das artes visuais no Recife

Janeiro marca o período de férias e uma animada busca por programas culturais. Embora Recife seja aclamada como um verdadeiro caldeirão cultural, a cidade ainda enfrenta a lacuna no reconhecimento e apoio aos talentos que moldam o cenário das artes visuais. A pesquisa “Dorso” , que acaba de ser lançada por pesquisadoras da área, revela um quadro preocupante para os profissionais locais.

O diagnóstico analisa informações sobre as condições de trabalho da cadeia produtiva do setor cultural e os financiamentos às artes visuais, além de resgatar a história recente das políticas públicas da Prefeitura do Recife voltadas para as artes visuais. “A pesquisa representa um primeiro passo importante para abrir debates sobre o cenário de trabalho atual no setor. Seu esforço está concentrado em organizar informações que, até então, não estavam estruturadas em nenhum outro meio. Para isso, o processo envolveu entrevistas, debates e um mapeamento histórico dos principais marcos do financiamento das artes visuais na cidade com o objetivo de realizar um levantamento de informações sobre o contexto socioeconômico das pessoas trabalhadoras das artes visuais em Recife”, disse Nathália Sonatti, proponente do projeto e pesquisadora.

Segundo a pesquisa, poucas são as categorias em artes visuais que trabalham com piso salarial mínimo e demais direitos trabalhistas, as jornadas são longas e não existem férias, a maioria dos profissionais não consegue se aposentar por não trabalhar com carteira assinada ou se aposenta apenas com um salário mínimo, a maioria trabalha de forma autônoma e independente como microempreendedor individual.

Em relação a editais, a pesquisa denuncia que são os mesmos nomes que aprovam projetos nos editais todos os anos e que há uma deficiência de políticas públicas e de recursos dentro desse setor: poucos editais na área e pouco investimento nos que já existem. “Há projetos em que se trabalha 12 meses, mas se recebe o equivalente a 5 ou 4 e continua-se trabalhando”, disse uma das entrevistadas no estudo.

Outra fonte, destaca que os equipamentos culturais não recebem verba suficiente para manter uma agenda própria. Para realizar ações nesses espaços, é preciso buscar financiamento de outro lugar, e que muitas vezes saem do próprio bolso.

A pesquisa foi produzida entre 2022 e 2023, com a participação de 30 curadores, artistas, produtores, representantes de galeria, gerentes de museus, estudantes, educadores, montadores/expografia, entre outros profissionais da categoria. As informações foram organizadas pelas pesquisadoras Nathália Sonatti, Bruna Lira, Luane Barbosa e Rebeka Monita, e contou com incentivo cultural do Sistema de Incentivo à Cultura (SIC), Fundação de Cultura Cidade do Recife, Secretaria de Cultura e a Prefeitura da Cidade do Recife.

No primeiro mapeamento 1.535 profissionais das artes visuais do Recife foram identificados no Mapa Cultural. No qual o número aumenta para 5.523 ao considerar a classe trabalhadora das artes visuais nas cidades da Região Metropolitana do Recife (RMR) que podem passar por situações semelhantes ou piores relatadas no estudo.

Segundo a pesquisa, de 2013 a 2023 não há disponível para consulta pública nenhum decreto ou lei que faça referência a cultura e artes visuais/plásticas segundo o portal LEGIS (Portal da Legislação Estadual de Pernambuco). Importa destacar, que nos últimos cinco anos, foram destinados ao Setor das Artes Visuais/Artes Plásticas, através de parcerias, editais de fomento e patrocínios R$ 413.000,00 da Lei Aldir Blanc, Prefeitura do Recife R$ 927.780,00 Exposições e outras ações culturais tendo como fontes parcerias com outros agentes sociais R$ 1.910.599,19.

“O orçamento aprovado pelo Poder Legislativo Municipal não detalha por linguagem cultural, a exemplo de Artes Plásticas/Artes Visuais. No referido orçamento constam várias rubricas que se referem a execução da política cultural planejada pelo Município, porém a destinação de valores para ações de artes plásticas/artes visuais, teatro, artesanato, música, etc, são distribuídas conforme o planejamento de cada linguagem da cultura do Recife e não são detalhadas na Lei do Orçamento Municipal. […] Destacamos que na programação Municipal destinada às Artes Visuais/Artes Plásticas, normalmente são produzidas exposições de iniciativas da sociedade civil, as quais não envolvem repasse de valores por parte do Poder Público Municipal. Nesses casos ocorre apenas a cessão do equipamento cultural e tais exposições, desta forma, são realizadas em parceria com os Órgãos Gestores de Cultura do Município”. Trecho da Chefia de artes visuais da Prefeitura do Recife sobre a situação do segmento.

A pesquisa aponta algumas reivindicações do setor que passam, de modo geral, pelo estabelecimento de um conjunto de políticas públicas, fazendo parte desse todo: criação de um plano de incentivo permanente, fortalecimento de pesquisas sobre a área, atualização dos valores de editais, criação de uma política de incentivo a artistas emergentes, entre outras.

A pesquisa está disponível no site https://dorso.com.br/,e os profissionais da área podem continuar a contribuir com o levantamento socioeconômico da categoria.

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